domingo, 16 de janeiro de 2011

OPECADO PROMOVE ENSAIO ABERTO DE HÁ VAGAS PARA RAPAZES DE FINO TRATO


Gente, primeiro eu queria contar uma história. Era uma noite de Valença, suja, tenebrosa, mês de dezembro. E a gente vagando, como dois perdidos...
Eduardo, indignado com o marasmo, com a falta do que fazer. Eu, anárquico, querendo subverter, transformar palavras em ações.
Daí, acho que Plínio Marcos baixou qual Exu em encruzilhada e começou a trabalhar.
Na mesma hora resolvemos voltar a fazer teatro.
E a história começou a surgir repleta de coincidências.
Eduardo, agora Cadu, não conhecia a história. Mas numa noite, locamos na Vídeo Split, do Cláudio, o filme e numa outra noite, adaptou a história.
Começamos a ensaiar. E a coisa foi nascendo.
Como parteiro, o mestre Juliano Britto veio ajudar.
Um parto difícil, demorado, apertado. Parecia que ia morrer.
O mestre Jhon desistiu. Saiu antes para não carregar mais um filho morto em suas costas. Daí, quando ninguém acreditava mais, o rebento resolveu nascer.
Veio com toda força. Rasgando tudo, correndo atrás do tempo perdido, se ferindo, se limpando...
Queria sair de qualquer jeito.
Nem que fosse apenas para ver a luz de uma noite. Já tinha passado da hora!
Sabia que era agora ou nunca. Estava com data, local e horário marcado. O burburinho começou a correr. Expectativas. Os que viram qualquer pedaço da criança gostaram do que viram. Incentivaram, mas no fundo não chegavam a acreditar que ela vingasse. Houve até quem, com muito tato, propusesse um aborto.
Às pressas, poucos amigos e curiosos foram chamados para presenciar o nascimento. Alguns, nem deu tempo. Outros foram pegos de surpresa. Enfim, com alguns minutos de atraso, no dia 29 de dezembro, no Cine Vitória, HÁ VAGAS PARA RAPAZES DE FINO TRATO, a mais nova montagem d’OPECADO, estreou.
Como em todo nascimento, a esperança se renova. Se os deuses do teatro forem generosos em 2011, logo ela estará mais uma vez em cartaz não só em Valença, mas circulando em outros espaços. Se não, valeu ter vindo ao mundo, mesmo que por uma noite.
E para fechar com mais uma coincidência, neste fim/início de ano, relembramos as palavras do mestre João Cabral de Melo Neto em “Morte e Vida Severina”, quando na última cena em que é o carpinteiro é interpelado pelo retirante se não é melhor saltar da ponte, a viver essa vida Severina:

—— Severino, retirante,
deixe agora que lhe diga:
eu não sei bem a resposta
da pergunta que fazia,
se não vale mais saltar
fora da ponte e da vida
nem conheço essa resposta,
se quer mesmo que lhe diga
é difícil defender,
só com palavras, a vida,
ainda mais quando ela é
esta que vê, severina
mas se responder não pude
à pergunta que fazia,
ela, a vida, a respondeu
com sua presença viva.

E não há melhor resposta
que o espetáculo da vida:
vê-la desfiar seu fio,
que também se chama vida,
ver a fábrica que ela mesma,
teimosamente, se fabrica,
vê-la brotar como há pouco
em nova vida explodida
mesmo quando é assim pequena
a explosão, como a ocorrida
como a de há pouco, franzina
mesmo quando é a explosão
de uma vida Severina!