quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Exposição Preta Flor continua no Centro de Cultura de Valença

Aberta nesta quarta-feira, 20 de Novembro, a Exposição “Preta Flor – por que nego não é flor que se cheire” continua aberta à visitação no Centro de Cultura de Valença até o dia 30 deste mês. Composta por 18 obras de16 artistas visuais, a exposição retrata o olhar dos mesmos a partir do título principal estabelecendo um diálogo além do óbvio quebrando paradigmas e superando preconceitos estratificados ao propor uma visão em diferentes perspectivas sobre o negro. No mês em que se comemora a “Consciência Negra”, particularmente num estado onde a maioria da população é afro-descendente e o preconceito e a discriminação prevalecem de forma velada ampliando-se sobretudo contra mulheres e homossexuais que diariamente são vítimas da violência, a exposição insere-se de forma subjetiva dentro destas questões. Os trabalhos são compostos em sua maioria por telas, exceto a escultura em madeira e ferro feita por Xisto Camardeli e os caixotes de madeira onde num gradeado Benilton Muniz expôs sua flor cibernética. É possível ainda costurar a trama composta por Celeste Martinez em tecidos e poesia na sua “Mulher preta flor”, na flor ‘cozida’ em fogo proposta por Horacio Martinez ou nos corpos que se abrem na dança dos girassóis pintados por Guilherme Vieira ou Adriano Pereira. Há ainda flores em cruz como a de Geilson Britto e outras que se abrem em sorriso como a tela pintada por Juliano. Contemporâneo, Otávio Motta foi além, na sua leitura numa enorme flor-amarela composta por couro cujo centro expõe o negro-drama dos retirantes no esturricado chão do sertão. “Há flores por todos os lados”: nas pétalas que se abrem em pernas pintadas por J Pincel, no mosaico composto por Lourdes Maria ou nos trabalhos de Gugui Martinez, Amália Grimaldi e Yara Lucia. A exposição conta com o apoio da DIREC 5 – Secretaria de Educação e APLB – Sindicato e continua aberta à visitação no Centro de Cultura de Valença das 8 às 22 horas até o dia 30 de Novembro.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

SONHO DE UMA NOITE DE PRIMAVERA OU APOCALIPSANDO GENÉSIO

I No princípio era o verbo. E o verbo se fez carne e habitou entre nós. Cris Rios entregou-me o livro fazendo antes a seguinte assertiva: - Vou te emprestar e você tem obrigação de ler! Como uma Bíblia. Mate-me por favor! – Era o título do livro. Foi parar em uma camiseta de Renato Russo que reciclei ao tirar da gaveta empoeirada onde guardo figurinos e roupas da juventude esvaída a cada dia. Com a ajuda de Jessé Delta a velha camiseta renovou-se em tons rosa choque. Era para ser apenas a frase. Mas artista adora moda. E o retrato em branco-preto ficou respingado por um rosa luminoso, bErrante! A fantasia estava pronta. Um tênis rasgado. Um velho jeans... Anarquizei. Virei punk. Já tinha decidido que ia de palhaço nesse circo sem futuro, mas se o rock errou, mudei de fantasia. Como cantou Raul: prefiro ser essa metamorfose ambulante... o resto todo mundo sabe, mas a prática anda longe da teoria a milhas e milhas nessa terra de gigantes. II Matheus Santana, vulgo Magyver, que de santo não tem nada, nem profissão, mas adora o perigo, bem que tentou impor suas mãos, mas a velha, esperta e experiente, recusou: - Na minha cabeça não! Eu tenho cabeça feita. E não é qualquer mão que toca nela. Aí, Telma Seixas me abriu os olhos: - Os erês tão zangado! Dê doce às crianças! Havia uma bala perdida no bolso. Deixei em cima da mesa e Leônidas, mesmo com ___ anos fez o caminho certo quando despertou de seu sono. Foi em cima: - De quem é? - É sua – respondi à queima roupa. E ele levou. Voltou com um vaso de bolinhas coloridas, escolheu uma branca e me deu. A velha pediu uma. Ele negou. Ela implorou. Ele explicou-a: - Você não precisa! Tem muito doce! Ela fez birra e conseguiu. Ele deu apenas um amendoim sem cor. Antiguidade é posto. Ela ordenou e ele obedeceu: - Bote no chão que eu vou escolher! Aí eu rolei de rir. Entrei em transe. O guri me deu um passe. Esticava minha cara e o palhaço dentro de mim veio à tona. Moleque. A água brotou do meu olho e lavou minha cara levando toda a tristeza embora. Alegria era meu nome. E tudo ficou limpo. Na saída, a velha me pergunta: - E sua conta? Não pode sair sem ela. É proteção! Agradeci a velha com um beijo em suas mãos e corri no supermercado. Comprei um pacote de balas e fiz o serviço. Três quartinhas embrulhadas de prata e outras perdidas nas mãos de meninos e meninas. Não adianta desesperar. Agora era espera. III Enquanto dormimos as forças trabalham. Tirei a guia vermelha na quinta à noite. Na sexta pela manhã ela desapareceu no meu quarto. Incréu, perguntei à minha mãe: - A senhora pegou? - Nem vi. Nem entrei no seu quarto! Pra não sair sem proteção, pus a branca e sai pra rua. Tato Drumond prometeu o fogo. E na sexta à noite desceu das calmas cachoeiras de Mutuípe, voando para essas terras. Baixou aqui com uma vassoura, além do fogo, claro. A noite, encruzilhamos entre bares, pela graça, no pepino, na frente do Estádio Sereião, esquinas e vielas da velha cidade tomada por tranca-ruas, exus e guardadores de carro, que nos protegeram pelo caminho das pedras. Às 4 da matina, depois de chamar o velho Adoniran (“Não posso ficar nem mais um minuto com você”), piquei a mula. O dia nasceu feliz! “Hoje eu não quero sair, hoje eu vou ficar quieto, não adianta insistir...”- Espriguicei-me na rede e nem os serafins que passavam pela porta ameaçavam-me tirar de casa. Mas a tentação era grande. “A lua me chama, eu tenho que ir pra rua!”. Graças a tecnologia, voei para a casa de Núbia Diaz no alto do Jambeiro. E adentramos a mata. Rezei a oração de São Jorge para que cães e animais peçonhentos ficassem longe. O barqueiro nos esperava. Prevenido, paguei meu tributo com um ramo de flores vermelhas atiradas nas águas escuras. A oferenda foi aceita. Terra à vista. Fértil. Que no brasilis “em se plantando, tudo se dá!”. A ilha. Paraíso perdido. Sem Pecados ao Sul do Equador. Céu e Inferno. O Hades. Reino das bruxas, gnomos, sacis, duendes e fadas. Uma fauna e flora de fazer inveja a Darwin. Fui bem vindo, embora sem o tradicional “doces ou travessuras”. Numa visagem, sobreveio-me a silhueta do Cérbero e suas duas cabeças a me olhar, balançando sua cauda. Corri antes que me atacasse, embora reze a lenda que “cão que late, não morde”. IV Domingo, acordei vivo. E a guia vermelha serpenteava em cima do toca-disco, louca para enroscar-se, mais uma vez em meu pescoço.