terça-feira, 28 de julho de 2009

UMA TENTATIVA DE ANÁLISE DA POESIA DE AMÁLIA

Conheci Amália primeiro através de sua escrita. Em um ou outro artigo escrito por ela no jornal Valença Agora. E me perguntava ao olhar para sua fotografia: quem é esta senhora que escreve com tanta desenvoltura sobre temas como identidade cultural, globalização, modernidade... temas até então mais apropriado para nós jovens, muito mais familiarizados com essa linguagem?
Depois, quando iniciamos o projeto “Ocupação Cultural”, por solicitação do acadêmico Araken Galvão, inseri Amália na minha rede de contatos do “msn”, vez que ela estava interessada em participar do nosso projeto. Confesso que para mim foi mais uma surpresa... Combinamos por este programa em conversas rápidas e curtas sua primeira participação no nosso evento sem nem nos conhecermos pessoalmente. No dia e hora marcado, lá estava Amália...
Sua participação continuou em outras edições da “Ocupação Cultural”, sempre combinadas pelo referido programa virtual ou por e mails. Só nos encontrávamos à cada edição da “ocupação”...e nossa amizade, quase que virtual, também.
Recentemente, na inauguração do quiosque com seu nome na praia de Guaibim, nos encontramos novamente. Amália, com a humildade que lhe é peculiar me pede para recitar um dos seus poemas que eu nem conhecia, mas topei de imediato. Era um poema sobre os manguezais e o nosso rio Taquari.
Ao final, Amália agradecida me presenteia com um dos exemplares de seu livro, sobre o qual pretendo tecer alguns comentários neste artigo. Desnecessário dizer que deliciei-me com a leitura do livro intitulado “quando”, o qual nomeia também a poesia homônima que abre a brochura.
Os poemas de Amália não se enquadram em nenhum estilo dado à sua variedade de temas e formas. Por vezes, suas frases são curtas, espécie de sentenças, numa economia de palavras que mais parecem anúncios... o que demonstra alguém bem antenado com o mundo onde vive. Numa sociedade consumista, onde somos bombardeados com anúncios a todo o momento, seus versos soam como tal justamente para ficarem em nossa memória. Não seria demais dizer que eles dariam uma boa campanha publicitária, espalhados em out-doors, embelezando nossa cidade com poesias.
Por outras, seus poemas são longos e envolventes, contando-nos engraçadas histórias como a de Mariella e Luís.
] Globalizada, mas em busca de suas origens, Amália descreve suas impressões em outras civilizações: Siracusa, Santiago, Barcelona... são algumas delas. Aqui descobre-se a beleza do tão caro “relativismo cultural” e a humildade despretensiosa adquirida em seu contato com outros mundos, sem esquecer do seu contato anterior com diversos povos indígenas que estão retratados também em seus poemas.
Em outros momentos, ela nos brinda com imagens e lembranças de lugares que, infelizmente, já não existem mais: “A rua do cais do porto”, a “quaresma na Triana”, na rotina do bairro do Tento, com seus peixes expostos na rua, nos fuás de boi rumo ao pó de serra... Aliás, o “pó de serra”, tão bem conhecido dos jovens de outrora, merece uma poesia especial cuja metáfora do desvirginamento beira à perfeição: “um dedal... um fundo de agulha...”
Sua poesia passeia ainda pelas ruas antigas de Salvador... desce pelo “bonde do Rio Vermelho”, ressoa no repicar de sinos, circula pelo bairro do Garcia...
Mas a poesia de Amália não é apenas saudosismo. Mulher de seu tempo e consciente do seu ofício, a poetisa reflete sobre a situação dos “meninos do candengo” que sonham, mas não vão à escola... Revolta-se com o descaso da Praia de Guaibim e em versos indignados denuncia o “turismo barato”, a degradação ambiental, o consumo descartável e as distorções da nossa modernidade em poemas como “Indústria Cultural”, ou na belíssima “Ontem e... Hoje”, onde descreve com maestria a passagem da máquina de datilografia para o computador.
Recomendo a leitura do livro, atentando ainda para a perfeição com que Amália registra o trabalho de artesãos e de objetos como as antigas moringas e lamparinas... descrição possível por que Amália, além de poetisa, é também artista plástica, onde com suas cores e traços revela mais uma faceta de sua personalidade.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

MÍDIA GRANDE OU MÍDIA GORDA?

MÍDIA GRANDE OU MÍDIA GORDA

Adriano Pereira*

Estava tranquilamente a ler minha Caros Amigos, única revista que não dispenso ler todo mês, quando de repente deparei-me com uma expressão casual do Colunista Hamilton Octavio de Souza “a mídia gorda propôs que as sessões do STF fossem gravadas e editadas...” (Caros Amigos, Junho 2009. p19)
Não reproduzirei o resto, embora seja um tema pertinente o “bate-boca entre os ministros Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes, por que o que interessa aqui é analisar o uso e adequação da expressão “mídia gorda”.
Nós que fazemos imprensa, mesmo que de forma “amadora”, constantemente vemos declarações do tipo: “os grandes meios de comunicação”, “a grande mídia”, “os maiores meios de comunicação”... e por aí vai...
Pode até parecer simples querela semântica... mas não é! Ao reproduzir tal discurso, e nós mesmo o fazemos, mesmo que involuntariamente, conscientemente ou não, acabamos por reafirmar uma segregação violenta e elitista que coloca os pequenos, sem recursos, “magros” e alternativos meios de comunicação como de pouca qualidade exatamente por que não têm recurso, grande tiragem ou até mesmo qualidade gráfica.
Como se esta mídia que é produzida pelo “baixo clero” e crescerá ainda mais agora com a revogação da Lei de Imprensa e abolição da necessidade do diploma de jornalista, fosse algo de pouca qualidade, mal feita, que nem deveria existir.
GRANDE é essa mídia, que sem recursos, luta contra titãs, numa verdadeira disputa de “Davi e Golias” para sobreviver e produzir um jornalismo de qualidade, levar informações e continuar no homérico esforço de informar a todos que muitas vezes não têm nem recursos para comprá-las.
GRANDES são esses repórteres, editores e produtores de tais mídias. Estes sim é que merecem nosso respeito e credibilidade. Daqui pra frente “grande mídia” somos nós. Os demais “jornalões”, devem ser tratados como “mídia gorda” pelas altas contas e grandes verbas que recebem, ou melhor aquinhoada.
À César o que é de César. Valeu Hamilton pela reflexão. E vida longa à Caros Amigos e toda a “grande mídia”


* Escreve sempre que pode em “pequenos” jornais locais como Valença Agora, Costa do Dendê, Rolando na Orla e foi um dos idealizadores da Rádio Comunitária Rio Una FM

quarta-feira, 8 de julho de 2009


ODE(IO) O DOIS DE JULHO
Em defesa do poeta Geraldo Maia


Nunca mais o despotismo
Regerá nossas ações
Com tiranos não combinam
Brasileiros corações.
(Hino ao 2 de Julho)

Adriano Pereira

Recebi por e mail, no 2 de Julho, a notícia da “triste partida” de um dos nossos grandes poetas, Geraldo Maia. Partiu do nosso Estado, auto exilou-se em Goiânia por, em suas próprias palavras, “não suportar mais o despotismo que imperam num governo que ajudou a eleger”. Pois é, Geraldo se foi. Está longe geograficamente, mas continuará presente em nossas vidas.
Primeiro, necessário se faz tecer algumas palavras sobre o poeta, pois embora autor de uma vasta obra, de ótima qualidade, seja pouco conhecido dos baianos, principalmente os jovens estudantes. Aliás, esta foi uma luta que ele travou incansavelmente nestas terras, não só no curto e tumultuado período que esteve na Secretaria de Cultura do Governo do Estado. Esta talvez seja a luta de uma vida inteira e um dos motivos de sua partida.
Durante todo este período, Maia, vem batalhando pela difusão da leitura, seja como fundador do Movimento dos Poetas da Praça da Piedade, nas oficinas de leitura que realizou, na poesia-terapia, ou mesmo recitando de forma comovente seus versos.
Conheci Geraldo Maia, primeiro através de seus versos. Quando ainda estudante secundarista, nas minhas incursões pela biblioteca municipal, ao lado do “velho Jhon”, buscávamos versos que pudéssemos adaptar para nossas apresentações teatrais. As poesias de Geraldo fascinavam-nos e nos tornamos fãs à primeira leitura... Foram seus os primeiros versos que decorei “somos a geração híbrida/ do tubo de imagem/ da antena paradiabólica...” E inúmeras foram as vezes que apresentamos seus versos intercalados em nossos textos.
No início do Governo Wagner, Geraldo esteve em nossa cidade junto com a “caravana de leitura”, projeto que mobilizou a todos e prematuramente foi encerrado, deixando muitas cidades do Baixo Sul apenas na vontade de vê-lo acontecer.
Neste mesmo evento preparamos uma simples homenagem improvisada à sua pessoa. Estava ele sentado à mesa quando pedi a palavra e comecei a recitar um dos seus poemas. Todos ficaram admirados com o texto e não foi menor a surpresa, quando ao final, em meio às estrondosas palmas que ressoavam pelo auditório, apontei para o autor dos versos que na mesa estava ainda emocionado. Depois Geraldo me confessou “nunca esquecerei aquele dia”. Creio que foi a consagração e reconhecimento que ele esperava, não como vaidade personalista, mas o reconhecimento da qualidade do seu trabalho.
Queria ainda registrar um outro episódio. Quando, inspirados justamente pelo Movimento dos Poetas da Praça da Piedade, iniciamos em nossa cidade em fevereiro deste ano o Projeto “Ocupação Cultural”, cogitamos a possibilidade de trazê-lo e estabelecemos o contato. A resposta foi imediata e positiva. Geraldo não só se propôs a vim, como realizar gratuitamente para os interessados uma “Oficina de Introdução à Poesia”.
Necessário se faz aqui registrar a humildade e disponibilidade deste grande ser humano. Nós não tínhamos dinheiro nem para pagar suas passagens, mas isso não foi empecilho: ele veio mesmo por conta própria, veio a pé da rodoviária já que não pudemos buscá-lo e enfrentou sem reclamar uma jornada ininterrupta que incluiu entrevista às rádios locais, a realização da oficina e ainda teve fôlego para esperar pacientemente sua vez de apresentar-se em meio à todos nós, na grande maioria anônimos, muitos ainda como estreantes naquela noite.
Uma verdadeira lição de humildade à determinados artistas que só querem aparecer e não nutrem nenhum espírito de solidariedade e respeito aos seus pares.
Com Geraldo aprendi muito e por esta razão sinto-me na obrigação de romper este silêncio e sair em sua defesa. Não por ele, mas por nós. Sabe-se que “nenhum profeta é bem quisto em sua terra” e com Geraldo não seria diferente.
Nos últimos meses, o poeta vinha, com sua verve incendiária, denunciando distorções visíveis que vêm acontecendo na Secretaria de Cultura do Estado. Com sua metralhadora giratória, detonou alguns desafetos e vinha sofrendo perseguições chegando ao limite com a sua exoneração.
É possível que tenham ocorrido excessos. Mas numa terra que abrigou gente como Gregório de Matos ou Castro Alves (Cecéu, como ele preferia) e num governo que se propõe democrático, que se propõe ser “A Bahia de todos nós”, não pode permitir que filhos ilustres, autores de uma obra tão bela, sejam condenados ao ostracismo ou silêncio só por “desafinar o coro dos contentes”.
Ao contrário, a permanência de Geraldo, não só em nosso Estado, mas nos quadros da administração estadual se faz mais que necessária por representar a diversidade e pluralidade de opiniões e posições. Ora, se estamos convivendo com os chamados de “direita”, como não conseguimos conviver com os “nossos esquerdistas”.
É por esta razão que, venho a público solicitar o bom senso de nossos ‘companheiros’ que estão no poder, que reconsiderem o equívoco e tragam de volta nosso Geraldo. E convoco todos nossos artistas de verdade a exercerem a solidariedade e manifestarem-se também.
Pelo respeito à liberdade de opiniões e à pluralidade. Por uma Bahia que seja de fato de todos nós!
QUEREMOS NOSSO POETA DE VOLTA!

* O título deste artigo foi retirado de mais um dos inúmeros poemas de Geraldo Maia em que ele denuncia a farsa do dois de julho comemorada sem o povo nos “anos de chumbo” do falecido ditador que governou a Bahia por décadas. A foto acima foi tirada na OCUPAÇÂO CULTURAL em q Geraldo esteve presente.