quarta-feira, 8 de julho de 2009


ODE(IO) O DOIS DE JULHO
Em defesa do poeta Geraldo Maia


Nunca mais o despotismo
Regerá nossas ações
Com tiranos não combinam
Brasileiros corações.
(Hino ao 2 de Julho)

Adriano Pereira

Recebi por e mail, no 2 de Julho, a notícia da “triste partida” de um dos nossos grandes poetas, Geraldo Maia. Partiu do nosso Estado, auto exilou-se em Goiânia por, em suas próprias palavras, “não suportar mais o despotismo que imperam num governo que ajudou a eleger”. Pois é, Geraldo se foi. Está longe geograficamente, mas continuará presente em nossas vidas.
Primeiro, necessário se faz tecer algumas palavras sobre o poeta, pois embora autor de uma vasta obra, de ótima qualidade, seja pouco conhecido dos baianos, principalmente os jovens estudantes. Aliás, esta foi uma luta que ele travou incansavelmente nestas terras, não só no curto e tumultuado período que esteve na Secretaria de Cultura do Governo do Estado. Esta talvez seja a luta de uma vida inteira e um dos motivos de sua partida.
Durante todo este período, Maia, vem batalhando pela difusão da leitura, seja como fundador do Movimento dos Poetas da Praça da Piedade, nas oficinas de leitura que realizou, na poesia-terapia, ou mesmo recitando de forma comovente seus versos.
Conheci Geraldo Maia, primeiro através de seus versos. Quando ainda estudante secundarista, nas minhas incursões pela biblioteca municipal, ao lado do “velho Jhon”, buscávamos versos que pudéssemos adaptar para nossas apresentações teatrais. As poesias de Geraldo fascinavam-nos e nos tornamos fãs à primeira leitura... Foram seus os primeiros versos que decorei “somos a geração híbrida/ do tubo de imagem/ da antena paradiabólica...” E inúmeras foram as vezes que apresentamos seus versos intercalados em nossos textos.
No início do Governo Wagner, Geraldo esteve em nossa cidade junto com a “caravana de leitura”, projeto que mobilizou a todos e prematuramente foi encerrado, deixando muitas cidades do Baixo Sul apenas na vontade de vê-lo acontecer.
Neste mesmo evento preparamos uma simples homenagem improvisada à sua pessoa. Estava ele sentado à mesa quando pedi a palavra e comecei a recitar um dos seus poemas. Todos ficaram admirados com o texto e não foi menor a surpresa, quando ao final, em meio às estrondosas palmas que ressoavam pelo auditório, apontei para o autor dos versos que na mesa estava ainda emocionado. Depois Geraldo me confessou “nunca esquecerei aquele dia”. Creio que foi a consagração e reconhecimento que ele esperava, não como vaidade personalista, mas o reconhecimento da qualidade do seu trabalho.
Queria ainda registrar um outro episódio. Quando, inspirados justamente pelo Movimento dos Poetas da Praça da Piedade, iniciamos em nossa cidade em fevereiro deste ano o Projeto “Ocupação Cultural”, cogitamos a possibilidade de trazê-lo e estabelecemos o contato. A resposta foi imediata e positiva. Geraldo não só se propôs a vim, como realizar gratuitamente para os interessados uma “Oficina de Introdução à Poesia”.
Necessário se faz aqui registrar a humildade e disponibilidade deste grande ser humano. Nós não tínhamos dinheiro nem para pagar suas passagens, mas isso não foi empecilho: ele veio mesmo por conta própria, veio a pé da rodoviária já que não pudemos buscá-lo e enfrentou sem reclamar uma jornada ininterrupta que incluiu entrevista às rádios locais, a realização da oficina e ainda teve fôlego para esperar pacientemente sua vez de apresentar-se em meio à todos nós, na grande maioria anônimos, muitos ainda como estreantes naquela noite.
Uma verdadeira lição de humildade à determinados artistas que só querem aparecer e não nutrem nenhum espírito de solidariedade e respeito aos seus pares.
Com Geraldo aprendi muito e por esta razão sinto-me na obrigação de romper este silêncio e sair em sua defesa. Não por ele, mas por nós. Sabe-se que “nenhum profeta é bem quisto em sua terra” e com Geraldo não seria diferente.
Nos últimos meses, o poeta vinha, com sua verve incendiária, denunciando distorções visíveis que vêm acontecendo na Secretaria de Cultura do Estado. Com sua metralhadora giratória, detonou alguns desafetos e vinha sofrendo perseguições chegando ao limite com a sua exoneração.
É possível que tenham ocorrido excessos. Mas numa terra que abrigou gente como Gregório de Matos ou Castro Alves (Cecéu, como ele preferia) e num governo que se propõe democrático, que se propõe ser “A Bahia de todos nós”, não pode permitir que filhos ilustres, autores de uma obra tão bela, sejam condenados ao ostracismo ou silêncio só por “desafinar o coro dos contentes”.
Ao contrário, a permanência de Geraldo, não só em nosso Estado, mas nos quadros da administração estadual se faz mais que necessária por representar a diversidade e pluralidade de opiniões e posições. Ora, se estamos convivendo com os chamados de “direita”, como não conseguimos conviver com os “nossos esquerdistas”.
É por esta razão que, venho a público solicitar o bom senso de nossos ‘companheiros’ que estão no poder, que reconsiderem o equívoco e tragam de volta nosso Geraldo. E convoco todos nossos artistas de verdade a exercerem a solidariedade e manifestarem-se também.
Pelo respeito à liberdade de opiniões e à pluralidade. Por uma Bahia que seja de fato de todos nós!
QUEREMOS NOSSO POETA DE VOLTA!

* O título deste artigo foi retirado de mais um dos inúmeros poemas de Geraldo Maia em que ele denuncia a farsa do dois de julho comemorada sem o povo nos “anos de chumbo” do falecido ditador que governou a Bahia por décadas. A foto acima foi tirada na OCUPAÇÂO CULTURAL em q Geraldo esteve presente.

Um comentário:

Chico Nascimento disse...

Os filhos da pauta estão entronados
A bandeira mascarada foi hasteada
O poeta é vitima
O poeta é órfão
Mas não é solitário
Vozes e atos hão de bradar
A liberdade está empobrecida
A democracia tomou outro lastro
Os filhos da pauta cavam torpes sepulturas
Hão de enterra-se sob o jugo da hipocrisia...
Chico Nascimento